O mistério do Penedo Furado do Monte da Meadela


As rochas, quando sujeitas à ação dos agentes atmosféricos (água, ar, variações de temperatura...) e dos seres vivos, passam por um conjunto de processos físicos e químicos que modificam os seus minerais. Como consequência, as rochas perdem coesão e ocorrem, frequentemente, mudanças na sua coloração. Este conjunto de transformações ou de alteração das rochas que se dá por ação dos agentes meteorológicos designa-se por meteorização. Após a meteorização a rocha tornada incoerente tende a ser removida, ação conhecida por erosão. Na sequência da erosão formam-se saliências na paisagem. Estas saliências ou geoformas podem ser de dimensão variada.


Em raras circunstâncias, ainda não totalmente conhecidas, a meteorização e a posterior erosão dão origem a pequenas cavidades que apresentam o aspeto de um favo de mel. Estas cavidades designam-se por tafoni (palavra de origem italiana que significa perfuração ou janela). Como o nome sugere, o Penedo Furado constitui um caso peculiar de um bloco com uma cavidade desenvolvida no seu interior.


O Penedo Furado é um bloco granítico com cerca de 7 m de comprimento, 3.5 m de largura, 3.5 m de altura, e com um volume aproximado de 55 m3 (Fig. 7.1). A cavidade interior corresponde a cerca de 9 m3 de rocha que já foi erodida, processo que continua lentamente a ocorrer.

Figura 7.1. Penedo Furado da Meadela.

A origem e desenvolvimento desta geoforma parecem estar relacionados com a meteorização, durante a qual terá ocorrido um processo de ataque químico abaixo da superfície topográfica em estreita relação com a rede de fraturas existentes no granito (Figs. 7.2 e 7.3). 

Figura 7.2. Perfil típico de meteorização em granito condicionado pela fraturação (Ruxton & Berry, 1957, in Migon, 2006, Granite Landscapes of the World, Oxford University Press).

Figura 7.3. Evolução de um relevo granítico por ação meteorização condicionada pelas fraturas e da erosão.

As paredes interiores laterais e superior estão integralmente modeladas por pequenos alvéolos bem individualizados, por vezes coalescentes, numa forma típica de favo de mel (Fig. 7.4).

Figura 7.4. Forma em “favo de mel” nas paredes internas do Penedo Furado da Meadela.

A exposição desta geoforma resulta da remoção da rocha sobrejacente desagregada devido à erosão, num processo comum a muitas áreas graníticas. Junto à base do tafone é possível identificar o bloco caído que inicialmente mantinha a cavidade mais isolada. 

Um pouco mais sobre a origem dos tafoni...


A origem e desenvolvimento dos tafoni ainda é alvo de discussão na comunidade científica, sendo atribuídos a vários processos e mecanismos. Sabe-se já, no entanto, que alguns se originam devido à ação da humidade do solo sobre a rocha abaixo da superfície. Alternativamente, muitos tafoni parecem originar-se e desenvolver-se à superfície, de acordo com mecanismos associados à meteorização. O desenvolvimento/alargamento das cavidades nos tafoni faz-se a partir do interior dos mesmos, podendo, no limite, levar ao rompimento da sua “capa” exterior. Variações de temperatura, congelamento e descongelamento da água e cristalização de sais, entre outros, podem ser alguns dos fatores responsáveis pelo alargamento das cavidades. Com o tempo, o invólucro exterior pode mesmo acabar por se ‘romper’. Na figura 7.5 podem observar-se diferentes estádios de desenvolvimento de um tafone.

Figura 7.5. Estádios de desenvolvimento de um tafone.

Tão perto do Penedo Furado mas tão diferentes...


Neste Monumento Natural Local, há ainda a registar aspetos curiosos observados na rocha metamórfica que se encontra próxima do granito em que ocorre o Penedo Furado. 


Apesar de estarem perto umas das outras, as rochas podem testemunhar processos geológicos diferentes com idades muito distintas. Os granitos desta região formaram-se há cerca de 300 milhões de anos mas estas rochas metamórficas são ainda mais antigas: têm cerca de 500 milhões de anos. Para além da diferença de idade, são rochas cuja origem é completamente diversa dos granitos. 


Estas rochas resultaram, inicialmente, de gros de areia (sedimentos) transportados pela água e posteriormente depositados em camadas horizontais (Fig. 7.6).

Figura 7.6. Estrutura sedimentar em camadas paralelas, originalmente horizontais e hoje inclinadas por ação tectónica.

O movimento dos sedimentos origina, por vezes, ondas de areia que se acumulam umas sobre as outras, formando estruturas concavas sobrepostas designadas por estratificação entrecruzada (Fig. 7.7). Mais tarde, estes sedimentos deram origem a uma rocha sedimentar compacta e endurecida, nela ficando impresso o registo dessas ondas de areia (Fig. 7.8). Finalmente, esta rocha foi transformada, por ação do calor e pressão, na rocha metamórfica que hoje se pode observar neste local. 

Figura 7.7. Formação da estratificação entrecruzada devido ao transporte de sedimentos.

Figura 7.8. Neste MNL a estratificação entrecruzada evidencia a origem sedimentar da rocha metamórfica.

Por vezes, são também visíveis neste local, dobras que afetam a estratificação da rocha metamórfica (Fig. 7.9). Esta deformação da rocha está relacionada com as forças compressivas que estiveram na origem do fecho do oceano primitivo em que se depositaram estas e outras rochas antigas de origem sedimentar e com a formação de uma cadeia montanhosa, há mais de 300 milhões de anos. Esta cadeia montanhosa foi erodida, mas estas são algumas das evidências da sua existência!

Figura 7.9. Camadas de rochas metamórficas de origem sedimentar, afetadas por dobramento.